terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Uma celebração a vida e um protesto contra a morte



No fim deste mês farão dois anos da morte de Artur Correa, não consegui esperar até a data para escrever sobre ele. De uns dias pra cá tem a lembrança dele tem sido muito forte pra mim.
Conheci Artur em 2005 e não fui com a cara dele de imediato. Tinha uma calma no falar que muito me parecia com arrogância, uma tranqüilidade que de início me causava irritação. Ao tronar-me amigo dele conheci uma figura única, talvez o ser humano mais completo que conheci.
Vivemos anos intensos de nossa amizade, tenho uma dívida com ele por seu companheirismo e integridade que jamais poderei pagar. Entramos em causas perdidas, barcas furadas, mas ele nunca abandonou o barco. Foi honesto, fiel  e sincero comigo até as últimas conseqüências, me encorajou nos momentos difíceis e sempre me dava um bom motivo para manter a cabeça erguida.
Artur também era um grande amigo para boas conversas, daquelas de varar madrugadas. Nos últimos dias venho lembrando de um domingo a noite onde passamos eu, ele, Gilson e Clarissa conversando até a madrugada na rua, falando e rindo alto, tomando cervejas (Arthur fingia que bebia) e depois correndo pelas ruas como moleques brincando de “toca”. São ótimas lembranças.
É impossível descrever em palavras o quanto Artur era uma pessoa marcante, nunca o vi negar ajuda a ninguém, sempre tinha conselhos muito sensatos e mesmo nas situações mais tensas e nas discussões mais fortes jamais alterava o tom da voz. Era capaz de manter a cabeça no lugar e tinha uma leitura apurada das situações e das intenções das pessoas. Conviver com ele faz muita falta, as vezes quando me pego diante de algum dilema ou problema penso “o que Artur me diria?”.  Nas poucas vezes em que passo perto de sua antiga casa lembro dos domingos que passávamos tomando vento e conversando bobagens, aperta uma saudade enorme.
Quando foi descoberto que Artur tinha um tumor no cérebro todos meio que intuíam o que aconteceria. A gravidade da situação denunciava um fim iminente. A figura de Artur tão debilitado, com um lado do corpo com os movimentos comprometidos e com a fala dificultada era uma facada sem misericórdia no peito. Nas últimas semanas de vida ele perdeu o contato efetivo com o mundo, o corpo ficou totalmente debilitado e ele perdeu a capacidade de falar. Sobrou apenas um movimento quase imperceptível em uma das mãos e o movimento dos olhos. Imagino o quanto foi difícil para ele passar os últimos dias sem poder conversar com aqueles a quem amava, sem poder se despedir e falar últimas palavras que serviriam de alento para seus parentes.
Mesmo sabendo que o falecimento do meu amigo era questão de tempo uma sensação boa me acompanhava. Eu e meus amigos sabíamos que nunca haviamos precisado sentir a ameaça de perdê-lo para reconhecer o quanto ele era importante. Sempre que estivemos juntos celebramos nossa amizade e isso me deixa orgulhoso além de transformar a saudade que hoje sinto dele em algo mais suportável. Quando seu problema de saúde surgiu isso apenas acentuou o que já sentíamos por ele.
Mais do que repetir o texto padrão de “bom amigo, bom filho, bom rapaz” Artur representa pra mim uma figura ímpar, que escolheu fazer de sua vida uma obra de arte, que optou por se manter acordado enquanto o mundo ao redor escolheu o sono, que quando todos pararam resolveu caminhar, que jamais se deixou levar pela iminência da morte e fez de seu próprio fim um protesto em favor da vida, da coragem, do sonho. Tanto que hoje ele permanece muito vivo de outras formas.
Uma figura como Artur deveria ter sido conhecida pelo mundo, por isso faço questão de que as pessoas saibam que um dia houve alguém como ele, capaz de sentir um amor sincero pelas pessoas sem exigir absolutamente nada em troca e de se oferecer para ajudar os amigos em seus sofrimentos apenas pelo prazer em fazer o que é certo. Manterei a memória dele viva.
Se o mundo não o conheceu, azar do mundo. Eu o conheci.

Das Tripas Coração

Lobão

Quem foi que disse a você, quero saber
Que perder é o mesmo que esperar?
Quero saber quem é que vai ficar tranquilo
perdido na beira do abismo, sangrando?
Se você pudesse ter alguém de joelho aos teus pés
A pedir o teu final
Sussurrando todo seu calor na tua orelha
Procurando uma palavra que não fosse em vão
Que fizesse você compreender...
Que eu abandono meu lugar rasgando as veias
Derramando o meu amor pelas areias
Anuncio um lindo sol radiante
A última alvorada em teu semblante
E na perfeição de um céu sem sombras
A gente vai se encontrar
Quem é que vai zombar desse Deus trapaceiro
Nesse Rio de Janeiro
Quem é que vai anunciar a próxima atração
E uivar pra lua cheia gargalhar dos tormentos do mundo
Quem é que vai ficar sorrindo jogando palavras ao mar
Vendo a terra toda estremecer
Quero saber quem é que vai guardar toda essa dor
De ficar sozinho no convés sem a tripulação
Sou eu...
Que abandono meu lugar rasgando as veias
Derramando o meu amor pelas areias
Anuncio um lindo sol radiante
A última alvorada em teu semblante
E na perfeição de um céu sem sombras
A gente vai se encontrar
E das tripas coração mais uma tarde
Pra levar o meu amor pra eternidade
Meu amigo, por favor, me aguarde
Que a gente vai se encontrar
Que a gente vai se encontrar


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