sábado, 7 de janeiro de 2012

RICARDO GONDIM - Em defesa de um pastor que luta contra o obscurantismo religioso

Notícia que li no blog do Paulo Lopes:
Pastor Ricardo Gondim afirma que ateus tem que ser ouvidos e respeitados
O pastor Ricardo Gondim é sem dúvida o líder religioso mais consciente e equilibrado do Brasil, tem tido uma postura respeitosa com outros credos, e com os que não seguem credo algum,  e defendido posições de extrema inteligência e ponderação. Talvez seja por isso que esteja mergulhando num processo de humilhação pública promovida pelos líderes evangélicos fundamentalistas na intenção de descredenciá-lo e impedi-lo de ser uma voz que coloque algum freio nessa “revolução pentecostal” que tem sido a cara da mudança social e religiosa no país.
Por “revolução pentecostal” entende-se o crescimento de igrejas protestantes de caráter fundamentalista, que afirmam ser a Bíblia o único livro que deve balizar as opiniões do fiel, seja politicamente, socialmente e até nas questões do conhecimento acadêmico científico(“só é verdade se estiver de acordo com a Bíblia”). Outras características marcantes do movimento pentecostal brasileiro é uma visão de mundo dualista onde tudo aquilo que não está escrito na Bíblia, ou, como na maioria dos casos, determinado pela liderança da igreja é fruto da ação demoníaca. Assim já se vê que esses grupos, devido a essa visão fundamentalista e infantil, rejeitam a secularização da sociedade e mais ainda o Estado Laico. São grupos que querem a partir da força social e eleitoral combater o pluralismo religioso, a diversidade sexual e cultural, além de combater qualquer tipo de informação científica que contradiga as narrativas bíblicas (as igrejas pentecostais são as que mais lutam pelo ensino religioso nas escolas e também pelo ensino da teoria criacionista).
Nesse contexto o pastor Ricardo Gondim foi uma voz destoante do movimento fundamentalista que se desenrola hoje no Brasil. Seu histórico de polêmicas, onde quase sempre tinha razão, vem de longe. Quando o movimento religioso protestante no Brasil ainda não tinha ganhado o caráter de “guerra cultural” no Brasil ele já denunciava o fundamentalismo de algumas denominações. Seu livro “É proibido: O que a Bíblia permite e a Igreja proíbe” de 1999 causou estardalhaço no universo evangélico.
Mas o Pastor entrou em rota de colisão direta com o fundamentalismo pentecostal de dois anos pra cá. Diante deste contexto, onde os tele-evangelistas estão mais interessados em passar uma visão deturpada do evangelho visando infantilizar os fiéis para que estes lhes garantam mais doações, Gondim passou a defender publicamente posições moderadas e que respeitassem o estado democrático de direito e a laicização do Estado (duas posturas odiadas pelo neo-pentecostalismo). 
Primeiro veio a entrevista na revista Carta Capital onde defendeu que os homossexuais deveriam ter direito a união civil e com os mesmos direitos de qualquer cidadão. O pastor não falou em momento algum que celebraria ou ordenaria celebrações de casamentos homo-afetivos, nem tampouco disse que não era pecado, apenas afirmou que perante a lei, que é laica e igual para todos, esse grupo deveria  ter direitos reconhecidos. Também afirmou não achar que Deus estivesse no controle de tudo, pois se assim fosse Ele seria o responsável pelas mazelas do mundo, o que se chocaria com a idéia de um “Deus bondoso”.  Foi o bastante para que uma tormenta caísse sobre o líder religioso. Um grupo de pastores da Igreja Betesda, da qual Gondim é pastor -presidente, rompeu com sua liderança e fundou uma nova denominação, a Beth Shalom, apenas devido a suas afirmações na entrevista (o que mostra as motivações desta denominação). Depois os diretores da revista evangélica "Ultimato" o demitiram do posto de colunista, que ele ocupava havia 20 anos, devido as mesmas afirmações.
Em 2011 postou em seu blog um excelente texto intitulado “Deus me livre de um Brasil evangélico”, onde denunciava as idéias fundamentalistas absurdas defendidas pelo movimento neo-pentecostal no Brasil. No texto ele expressa preocupação com a destruição cultural, social e intelectual que um movimento tão radical poderia trazer. ( Leia aqui)
O pastor está pagando o preço de lutar contra a descaracterização de sua fé feita por aqueles que são seus congêneres. O levante pentecostal brasileiro segue as regras do mesmo movimento ocorrido nos EUA:
a)      Interdição do debate político-social de uma sociedade democrática, ao tentar levar a retórica religiosa para a política promovendo um ataque frontal contra a separação entre igreja e Estado
b)      Perseguição e difamação de movimentos sociais de minorias como feministas ou organizações de defesa dos direitos homo-afetivos, bem como a perseguição a ateus e livre-pensadores
c)       Defesa de pseudo-ciências, como o ensino criacionista nas escolas e a obrigação de ensino religioso nas escolas públicas. Além do ataque raivoso ao evolucionismo darwinista
d)      Manipulação do voto dos fiéis, forçando-os a votar em candidatos religiosos e com a formação de verdadeiros  “currais eleitorais” dentro das igrejas
e)      Forte ênfase nos dízimos, nas ofertas e nas promessas de que o fiel terá prosperidade financeira ao contribuir com a “obra”
f)       Apelo a supostos milagres de cura e libertação (todos sem comprovação factual e que de tão picaretas chegam a ser hilários)

Hoje Gondim e aqueles que compactuam com suas idéias representam uma parcela mínima do movimento evangélico no país. O crescimento pentecostal é liderado por Igrejas e tele-evangelistas que estão sempre ávidos em pedir dinheiro aos fiéis, cada vez em quantias mais elevadas, se aproveitando do desespero ou do desconhecimento de uma enorme parte da população. Esse grupo majoritário é que consegue horários pagos na TV, elege políticos cuja a única ideologia é o reacionarismo, além de promover o preconceito contra ateus, homossexuais, feministas, adeptos de religiões afro-brasileiras e livres-pensadores em geral.
O pastor Ricardo Gondim hoje é considerado um herege. E deve sentir muito orgulho disso.

Frases do pastor Ricardo Gondim:
“Todavia, reafirmo minhas palavras: em um Estado laico, a lei não pode marginalizar, excluir ou distinguir como devassos, promíscuos ou pecadores, homens e mulheres que se declaram homoafetivos e buscam constituir relacionamentos estáveis. Minhas convicções teológicas ou pessoais não podem intervir no ordenamento das leis.
Eu não fiz uma defesa da homossexualidade, e sim dos direitos dos homossexuais. O direito deve premiar a todos. Num Estado democrático, até mesmo os assassinos têm direitos. Não é porque eles cometeram um crime que possam ser torturados ou agredidos, por exemplo. As igrejas podem ter uma posição contrária à homossexualidade, mas não podem confundir seus preceitos com o ordenamento jurídico do país ou tentar impor sua vontade. Muitos disseram que o Supremo Tribunal Federal tripudiou sobre as igrejas evangélicas ao reconhecer a união estável homoafetiva. Nada disso, o STF estava apenas garantindo os direitos de um segmento da sociedade. Essa é sua função.”

“Deus soberano é uma visão construída na Idade Média, e serviu muito aos interesses de nobres e pessoas do clero que, para justificar seu poder, se colocavam como representantes da vontade divina na terra. Só que essa visão é incompatível com o mundo de hoje. O Estado é laico. As pessoas guiam os seus destinos. Deus não pode ser culpado por uma guerra, por exemplo. Não vejo nisso nenhuma expressão da vontade divina, nem como punição.”
“Nem todos os evangélicos pensam como esses grupos midiáticos que confundem preceitos religiosos com ordenamento jurídico e querem impor sua vontade a todos.”

"Deus não é rival da liberdade humana, mas seu maior incentivador."
(Grifos nossos)
Leiam também:
Reportagem da revista Carta Capital: “O Pastor herege” http://www.cartacapital.com.br/sociedade/o-pastor-herege/

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